Local e data: Assembléia Legislativa do PR, dia
11-12-13 (9.30 – 13.00 h)
Na mesa, os deputados estaduais Péricles,
Rasca Rodrigues e Tadeu Veneri;
Diogo Oliveira, antropólogo da FUNAI no PR;
Olympio Sá Sotto Maior Neto – Coordenador
do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Promoção aos
Direitos Humanos do Ministério Público;
Dr.Teo Marés – Procurador do município de
Pinhais-PR;
Dra.Antonia Lélia Neves Sanches –
Procuradora da República no Estado do Paraná;
Dr.Luis Eduardo Canto Bueno – Coordenador
da Área Indígena do Caop-DH;
Cacique Kaigang Romancil Cretã - filho do Cacique Ângelo Cretã que foi
assassinado no passado na região de Mangueirinha na luta pela reconquista das
terras indígenas;
Cacique Guarani Ilson Soares – aldeia
indígena Tekohá Yhovy;
Rildo Mendes – Coordenador Administrativo
da Articulação dos Povos Indígenas do Sul – Arpin – Sul.
Sra. Tina Tchenna Maso – Representante da Plataforma Dhesca Brasil que defende a causa indígena.
Fala do Cacique Kaigang Romancil Cretã (filho do Cacique Cretã – morto pela causa
das terras indígenas):
O Paraná esconde uma
história. E esta história é a que levou
os índios do estado à situação de
penúria em que se encontra hoje. O PR
construiu uma economia importante mas não olhou para os povos indígenas. Um decreto do então governador Moyses Lupion
usurpou uma área muito expressiva que pertencia aos índios. Terras indígenas que estavam em nome da
União e que não poderiam ser repassadas a terceiros (como foi feito) por um
decreto do governador do estado. Ele
disse que a atual ministra Gleisi, que é do Paraná, ao seu ver nunca falou a
favor dos índios do estado.
Os indígenas que foram expulsos da região
de Guaira – PR estão retornando, mas enfrentam a reação dos que usurparam suas
terras. Relembrou inclusive do
Cacique Cretã, que era de Mangueirinha-PR e foi assassinado na luta pela posse
das terras. O processo demorou 40 anos
para os índios retomarem a posse legal de suas terras em Mangueirinha. Ele disse que aparentemente
não se vê muita reação, mas os índios não estão parados em suas ações na busca
de reaverem suas terras.
Disse que do tempo do governo FHC para cá,
foram mortos no Brasil 727 indígenas, a maioria, lideranças destes que lutavam
pela reconquista das suas terras. Suas
e dos seus antepassados. Em geral,
crimes impunes. Segundo dado citado na
mesa, dos 727 índios mortos, ao redor de 400 teriam sido no tempo dos dois
mandatos do Presidente Lula.
Falou da PEC 215 que é péssima para os
indígenas. Tira do governo federal (do
executivo) o poder de decidir sobre demarcações de terras indígenas e passa
para o Congresso Nacional. Entende que
assim piora tudo e não se demarca mais nada.
Disse que no Brasil em 1500 havia ao redor
de cinco milhões de indígenas aqui e na atualidade seriam apenas 750.000. Somos uma das maiores economias do mundo e
estamos tratando de forma miserável os povos tradicionais de modo geral e os
índios em particular. (Tem os
quilombolas e outros).
Informou que na região de Guaira – PR onde
há OITO acampamentos indígenas, as condições de saúde, saneamento, educação,
são todas quase inexistentes. O Estado
não tem feito nada. Não tem posto de
saúde, água potável e os ônibus escolares das prefeituras não levam as crianças
indígenas para a escola alegando que isto é atribuição da FUNAI.
Citou que no estado do MS há mais boi do
que gente. E provocou: Será que o boi é mais importante do que o
índio?
Em Guaira – PR uma das alegações das
autoridades para não dar assistência aos índios que estão em acampamento
precário é que muitos deles estão vindo de fora, já que lá é fronteira com o
Paraguai, MS, etc. Ele alega que na
verdade, são índios originários da região de Guaira. Se espalharam quando foram escorraçados de
suas terras, mas são de lá. A proposta dele é que se forme uma
Comissão Mista de Deputados Estaduais e lideranças indígenas para rever o
decreto do Governo Moyses Lupion e buscar uma solução justa para que os índios
tenham sua terra.
Fez constar que em Guaira – PR chegaram a
seqüestrar a secretária da FUNAI local
para intimidar os índios que lutam por suas terras. A indústria da construção civil local e
mesmo as Cooperativas agropecuárias não admitem mão de obra dos índios para
dificultar a presença deles na região.
Houve um “atropelamento” com morte de um índio lá em Guaira numa forma
muito suspeita, com alta velocidade, dentro da cidade. Houve tiroteio e morte de índio em Guaira e
as autoridades alegaram que foi “briga de bar”, sendo que o tiroteio ocorreu na
rua. Agradeceu a mesa por lhe conceder
a palavra e disse que espera que esta
Audiência Pública seja o primeiro passo para que se dê atenção à causa e que se
faça algo pelos índios. São mais de dois mil índios acampados entre
Guaira e Terra Roxa – PR.
Lembrou que as autoridades de Guaira
chegaram a apoiar uma manifestação contra a presença dos índios acampados no
município e que a prefeitura iria dispensar os funcionários públicos para
engrossar o movimento e que isso teria sido impedido pela Justiça local.
Em resposta aos que dizem que os índios, em
parte, vieram de fora e são “estrangeiros”,
ele lembrou que foram eles os primeiros a habitarem estas terras E QUE
NÃO FORAM ELES QUE CRIARAM FRONTEIRAS NEM DE ESTADO, NEM DE PAÍS NA REGIÃO DE
GUAIRA – PR. As fronteiras foram
coisas dos colonizadores.
Fala
da Sra.Tina Maso:
O MS é o segundo estado brasileiro em número de indígenas e lá tem
muitos índios sem território e sem cidadania.
Gente vivendo em acampamentos em beira de estradas, de rodovias, sendo
que crianças indígenas estão no risco permanente de atropelamento. Também tem as aplicações de agrotóxicos nas
fazendas, ameaçando os índios acampados.
Os cidadãos brasileiros quase nada
conhecem sobre nossos índios e a reação é de repulsão a quem não se
conhece. Há escolas em certas aldeias,
mas o material escolar em geral não é adequado às crianças indígenas que
aprendem cedo a língua materna e depois na escola tem dificuldade com o
material escolar inadequado à sua cultura.
Quando foi promulgada a Constituição
Federal em 1988, esta deu prazo de CINCO anos para serem demarcadas as terras
indígenas. Infelizmente ficou só no
papel a grande maioria dos casos. A
FUNAI nem sempre tem os recursos financeiros, materiais e humanos para cumprir
de forma adequada às suas funções. Ela
faz um esforço, mas faltam meios.
O Brasil é um dos primeiros países a
implantar Postos de Saúde para os indígenas, mas os tais não foram estruturados
de forma adequada ainda. Há
precariedade.
Ela disse que a grande mídia não destaca a
causa dos índios.
Fala
da Dra.Antonia Sanches – Procuradora da República no Paraná:
Ela acompanha a causa dos índios há
anos. Falou dos Oito Objetivos do
Milênio e lembrou que o Brasil é signatário dessas metas e cuidar dos índios e
das demais comunidades tradicionais está no contexto.
Destacou o Artigo V da Constituição Federal de 1988 que é
contra a vida degradante. Os indígenas
lá do Oeste do Paraná estão ao deus dará.
Dentro do que diz a CF de 1988, o MPF
defende que enquanto os índios não conseguem a posse das suas terras, deveriam
ter acesso ao menos a moradias dignas na região. Ela disse que o MPF não tem a solução
imediata para a questão e pede para o poder público ouvir (e ir lá conhecer) as
comunidades indígenas e procurar encaminhar suas lutas, suas demandas. Na opinião dela uns 2.000 alqueires de
terra (não é muita coisa) poderiam dar algum alento aos índios da região que
estão na condição precária.
Fala
do Representante do Ministério Público Estadual
Elogiou os três deputados estaduais
presentes (Tadeu Veneri, Péricles e Rasca Rodrigues) por serem os que estão
preocupados com essa causa. Ele diz
que deveria se restabelecer uma sede da FUNAI aqui no Paraná. Recentemente a sede local de Curitiba foi
transferida para Chapecó-SC (ao que
parece por alegação que estaria mais próxima das comunidades indígenas). Recomenda que se continuem os trabalhos de
demarcação das terras indígenas no PR.
Reprovando a passeata que houve em Guaira
– PR contra a presença dos indígenas por lá, destacou que todas as esferas do
poder público e a sociedade civil organizada podem e devem agir em prol dos
povos indígenas.
Pediu que se adapte o Pronaf (Programa Nacional de Apoio ao Agricultor
Familiar) que é do Governo Federal e que
tem verba para financiar os pequenos agricultores, de forma a atender também os
índios.
CARTAZ
- foi colocado na altura da mesa
da Audiência um cartaz com os dizeres:
“ Quantas cruzes serão necessárias para crucificarem os povos indígenas
se o nosso país continuar com este caráter desenvolvimentista predatório e
autoritário?”
O cartaz tem a chancela
da ARPIN, APIB Associação dos Povos Indígenas do BR e da ONG Somos Todos
Guarani Kaiowa.
Após as falas, foi anunciado pela
integrante do MPF que foi restabelecida a sede da FUNAI para o Paraná e que a
mesma será instalada até março de 2014.
Fala
do Antropólogo Diogo Oliveira – pela FUNAI do Paraná. (10:45h)
Tem menos de dois anos de FUNAI, atuava em
Guaira – PR e já sofreu ameaças por causa da luta pela causa dos índios. Ele fez um breve histórico das leis e ações
da FUNAI.
Artigo 231 da CF de 1988 – Direitos
fundamentais dos povos indígenas.
Antes de 1988 a lei brasileira não
assegurava aos povos indígenas os meios para que estes vivessem de acordo com
as respectivas culturas. Era então a
chamada visão Civilista. Já a CF de 1988
deu essa garantia no papel e nesse aspecto foi um avanço. O duro está sendo tirar isso do papel.
A FUNAI é ligada ao Ministério da
Justiça. Há no Brasil 419 terras
indígenas demarcadas. Algo como 12% do
território nacional (105 milhões de
hectares). Por outro lado, ainda há
antigos moradores em muitas dessas áreas que assim não estão ainda de posse
completa pelos índios.
Ele disse que os dados dos diferentes
órgãos do governo sobre a população indígena ainda tem divergências. Tem da área de saúde, educação, etc.
Mato Grosso do Sul – 1,46% de áreas
indígenas. Os números a seguir
mostram um pouco da realidade dos “amontoados” em que estão os índios em MS. A população geral do MS
está com a seguinte densidade: 6,86 habitantes/km2. No caso dos índios do estado, são 149 indios/km2.
PR nosso estado tem 0,5% do território
como terra indígena.
Problemas alegados pelo representante da
FUNAI:
Ø
Falta de profissionais especializados não só nos
quadros da FUNAI como no País;
Ø
Resistência dos ocupantes das terras em disputa
– quando a FUNAI vai a campo há risco de vida aos seus quadros;
Ø
Judicialização (meandros legais) dos processos administrativos;
Ø
Pressão política
A FUNAI tem
buscado integração com outras entidades, principalmente com o INCRA que é
federal e está envolvido com a Reforma Agrária.
Um nó (expressão minha): Ele disse que no caso do Paraná, houve lá no
passado (Governo Moyses Lupion) um decreto estadual que “doou” terras da União
(de forma ilegal) aos agricultores. Agora, se a FUNAI tenta retomar terras da
região para os índios, o agricultor busca indenização e a União não tem meio
legal para indenizar o que “já é dela” por direito. Eis o nó.
No Paraná, até 2009 a FUNAI tinha os
escritórios de Curitiba, Londrina e Guarapuava.
Na reestruturação recente, a sede de Curitiba foi extinta e a sede que
rege o Paraná está em Chapecó-SC.
O representante do Ministério Público
Estadual sugeriu ao colega da FUNAI que nesse processo de se restabelecer o
escritório da FUNAI em Curitiba (previsto para março-14), que se apresente os
pré requisitos para que o mesmo se instale com o aparato humano, etc, de forma
a poder agir de forma adequada.
O Diogo lembrou que na reestruturação
foram mantidas representações da FUNAI em locais perto dos índios como em
Guaira, São Jerônimo da Serra, por exemplo.
Sobre
demarcação, ele informou que os responsáveis por esta área na FUNAI ficam
centralizados em Brasília.
Foi dito que a Emater
(que presta assistência técnica aos pequenos produtores rurais) do Paraná tem
acesso a recursos financeiros do MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário para
atuar em terras indígenas. Por outro
lado, a Emater não disponibilizou técnicos para atender os índios em Guaira nem
em Terra Roxa-PR. O promotor ficou de
cobrar esse tipo de ação do Governo do Estado.
O Diego lembrou que o gargalo é o fato dos
índios não deterem a posse da terra e então o Estado do Paraná não leva nenhum
tipo de assistência a esses povos.
A representante do Ministério Público
Federal, que conhece a realidade de
campo do setor, disse que seria interessante os agentes envolvidos na causa
irem lá visitar os povos indígenas e ver como vivem e suas angustias e
demandas. Muito razoável a colocação dela,
por sinal.
O Diogo da FUNAI lembrou que os trabalhos
técnicos para a busca da demarcação das terras indígenas na região de Guaira –
PR, Brasília (FUNAI) solicitou laudos
para uma Antropóloga da UEM
Universidade Estadual de Maringá e após quatro anos ela não tinha dado
retorno. Teve que ser cobrada
judicialmente e então ela apresentou um laudo “preliminar” que a FUNAI julgou
insuficiente. Tudo isso vai retardando
o processo.
Na parte onde o plenário se manifestava, o
Diogo da FUNAI destacou que aqui no Paraná a instituição tem dificuldade enorme em ter um diálogo qualificado com o governo do
Estado. Este é um aspecto que
dificulta ainda mais os trabalhos desta.
Fala
de uma autoridade ligada ao Ministério Público.
O senso comum é dizer que o índio quer
muita terra para pouca gente. É um
argumento contra a cultura indígena e ainda preconceituosa. Lembrou que as áreas comprovadamente mais
preservadas no BR estão em reservas indígenas onde ao redor de apenas 0,5% está
sem a cobertura da mata nativa.
Fala
da Dra.Maria Tereza Uille Gomes:
A Secretária Estadual de
Justiça e Cidadania do Paraná usou a palavra
(ela chegou por volta das 12 h – talvez tenha vindo de algum outro
compromisso de trabalho) e no caso de Irati-PR onde os representantes
reclamaram da falta de ação do Governo do Estado na questão indígena, ela
sugeriu que se construa um Plano num trabalho conjunto entre o Estado e a
sociedade civil organizada para delimitar o problema e buscar soluções para o
caso.
O cacique indígena de Mangueirinha
(Romancil Cretã), sobre a questão indígena no Sul do Brasil, disse que já houve
dois eventos com a presença do Ministro da Justiça, um no RS e outro em SC e
que estaria sendo articulado um terceiro aqui em Curitiba-PR para janeiro de
2014. Sugere que façamos esforço para
que o Ministro venha também no evento do Paraná.
Uma senhora do Tribunal de Contas do
Paraná falou um pouco do ICMS ecológico que é repassado aos municípios. Há uma lei estadual que determina que parte
desse ICMS ecológico quando recebido por municípios que tem comunidades
indígenas, tem que ser repassado para o bem estar dessas comunidades. Em seguida foi dito que houve uma ADIN Ação
Direta de Inconstitucionalidade e que essa lei estaria suspensa.
Foi dito em plenário sobre as áreas mais
preservadas no Brasil (florestas preservadas).
Em áreas indígenas, com apenas 0,5% das áreas desmatadas para moradias e
o restante preservado – primeiro lugar em preservação. Em segundo lugar as áreas
dos Parques Ecológicos; em terceiro lugar, as áreas de Reforma Agrária ocupadas
pelos que lutam pela posse da terra.
No plenário surgiu a pergunta para
reflexão – Se no BR há políticas públicas para atender a pobreza, por que não
ter para atender também os indígenas?
Para mostrar a falta de informação e a
discriminação contra os índios, as lideranças em prol da causa destes estava
articulando para conseguir a construção da Casa de Passagem para abrigar na
cidade os índios que passam por lá, inclusive na lida das vendas dos
artesanatos. Um representante da
imprensa local teria abordado as lideranças e dito: Não fomos consultados se queremos ou não ter
aqui no município uma Casa de Passagem.
E a liderança trouxe para a reflexão:
Se fosse articulação para a construção de um clube para a cultura
germânica na região, certamente eles não precisariam consultar a comunidade
para saber dos prós e contras.
Consta que aqui no Paraná há lideranças
querendo que se remova os índios que estão acampados na luta pela terra no
Oeste do estado para a Ilha Grande, na divisa do Paraná com Mato Grosso do Sul. Ilha do Rio Paraná. A FUNAI e os índios não vêem isso como
solução do problema.
Fala
do Dr.Luis Eduardo Bueno - Sobre o descalabro em relação aos índios, foi
dito que faz aproximadamente um ano que mataram um cacique indígena no MS e até
agora as autoridades responsáveis não acharam nem o corpo do cacique. Nem se fala das outras providências que
deveriam ser tomadas. Descaso.
Lembrado que a Hidrelétrica de Itaipu é
bi-nacional e poderia dar uma atenção para os índios da região, tanto do lado
brasileiro como paraguaio. Inclusive
dito que do lado paraguaio os índios também estão em situação de miséria. Terras indígenas foram alagadas em grande
escala pela barragem.
Foi feito um alerta sobre a PEC 215 que é
altamente nociva às demarcações – dificultariam as mesmas se for aprovada. Também o novo Marco da Mineração seria
muito nocivo aos indígenas brasileiros.
Isto foi o que consegui anotar. Espero ter captado de forma razoável as
mensagens e a intenção é que os dados sejam úteis a quem se interessa pela
causa.